Estudo analisa o setor de drenagem e manejo de águas pluviais urbanas no Brasil

Para onde vai a água da chuva? Sem um sistema de drenagem adequado, às vezes – infelizmente – a água pode ir para dentro de nossas casas. E por que isso acontece? O Trata Brasil, em parceria com a GO Associados, divulgou o “Estudo sobre o setor de drenagem e manejo de águas pluviais urbanas no Brasil”. que oferece um diagnóstico sobre a prestação desses serviços essenciais para as cidades brasileiras e indica possíveis caminhos para a sua tão necessária melhoria.

O QUE É DRENAGEM? A drenagem e manejo de águas pluviais urbanas têm papel essencial no controle do escoamento das chuvas, prevenindo alagamentos, erosão do solo e deslizamento de encostas. Ele é especialmente importante no Brasil, que, por estar situado em uma zona tropical, é frequentemente afetado por precipitações intensas, conhecidas popularmente como “chuvas de verão”. Ao longo da história, diversos eventos dessa natureza foram registrados1, como a enchente do rio Guaíba (Porto Alegre – RS) em 1941, os deslizamentos na Serra das Araras (Estado do Rio de 1Atlas Digital de Desastre no Brasil (2023) Janeiro) em 1967 e os deslizamentos ocorridos na região serrana do estado do Rio de Janeiro em 2011, os quais resultaram em mais de 947 vítimas fatais e mais de 300 pessoas desaparecidas.

Mais recentemente, ocorreu o desastre no Rio Grande do Sul em 2024 que, de acordo com as informações da Defesa Civil do estado, vitimou 183 pessoas e deixou outras 27 desaparecidas. De acordo com o Atlas Digital de Desastre no Brasil (2023), que reúne dados do Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional no período de 1991 a 2023, foram registrados 25,94 mil eventos hidrológicos de desastres. Destaca-se que, nos últimos 15 anos, 74% desses eventos estiveram relacionados a chuvas intensas. Nesse intervalo, os desastres resultaram em 3.464 mortes e causaram prejuízos superiores a R$ 151 bilhões, sem considerar os impactos do desastre ocorrido no estado do Rio Grande do Sul em 2024. A recorrência desses desastres expõe a fragilidade da infraestrutura urbana e evidencia a necessidade de integrar a drenagem e o manejo de águas pluviais ao planejamento do saneamento.

DIAGNÓSTICO DA DRENAGEM NO BRASIL O Diagnóstico Temático do Sistema Nacional de Informações em Saneamento Básico (SINISA) para Drenagem e Manejo de Águas Pluviais Urbanas (DMAPU) é um documento técnico produzido pela Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades. O diagnóstico referente ao ano-base de 2023, divulgado em março de 2025, contou com a participação de 4.958 municípios, representando 89,0% do total de 5.570 municípios brasileiros. Esses municípios abrangem 95,1% da população total do país (195,1 milhões de pessoas). Entre os municípios analisados, 40,44% declararam possuir sistemas exclusivos para drenagem de águas pluviais, enquanto 12,59% operavam sistemas unitários, que combinam esgoto e drenagem em uma única rede. Além disso, 14,48% dos municípios informaram operar sistemas combinados, com configurações exclusivas e unitárias em diferentes trechos, enquanto 32,49% relataram não possuir qualquer tipo de sistema de drenagem.

Por outro lado, apenas 3,2% dos municípios (157 ao todo) informaram contar com sistemas de tratamento das águas pluviais, prática fundamental para mitigar os impactos ambientais. No que tange à infraestrutura, 78,2% das vias públicas urbanas no Brasil possuem pavimentação e meio fio, mas apenas 33,5% contam com redes ou canais pluviais subterrâneos. Já os parques lineares, que combinam benefícios ambientais, de lazer e proteção contra inundações, foram identificados em 412 municípios.

O diagnóstico revelou, ainda, que apenas 263 municípios, o que representa 5,3% do total, possuem Planos Diretores de Drenagem e Manejo de Águas Pluviais (PDD), ferramenta essencial para o planejamento estratégico e a redução de riscos associados a eventos hidrológicos extremos. Ou seja, dos 4.958 municípios com informações para o módulo de Águas Pluviais do SINISA, 4.695 declararam não possuir PDD.

Dos 100 municípios mais populosos do país, 94 estão mapeados com algum tipo de risco, segundo o estudo, o que corresponde a 54% da população nas áreas com riscos mapeados. Apenas Maringá (PR), Ponta Grossa (PR), Cascavel (PR), Uberaba (MG), Taubaté (SP) e Palmas (TO) não tiveram riscos classificados na referida base.

PARA MUDAR O CENÁRIO, QUAIS OS PRINCIPAIS DESAFIOS MAPEADOS? Dentre os principais desafios para a efetiva integração da drenagem ao saneamento básico está a necessidade de seu adequado planejamento pelos municípios. Com o Novo Marco, os Planos Municipais de Saneamento Básico (PMSB) passaram a ter a obrigação de incluir a drenagem e o manejo de águas pluviais, além do abastecimento de água, esgotamento sanitário e resíduos sólidos urbanos. Entretanto, muitos municípios que elaboraram seus planos antes da referida Lei concentraram-se apenas no abastecimento de água e esgoto, tratando a drenagem e os resíduos sólidos de forma superficial, sem planejamento detalhado ou previsão de investimentos de longo prazo. Isso resultou em planos incompletos, que não incorporam estratégias eficazes para enfrentar os desafios da drenagem urbana.

A drenagem e o manejo de águas pluviais urbanas enfrentam inúmeros desafios no Brasil, tanto pela complexidade das infraestruturas quanto pela carência de planejamento estratégico e recursos humanos qualificados. Apesar de avanços normativos e da crescente preocupação com os impactos climáticos e ambientais, diversos entraves ainda dificultam a implementação de soluções eficazes. Entre eles, destacam-se a ausência de planos diretores, os problemas e vácuos regulatórios, a falta de incentivos à investimentos, a carência de pessoal especializado e as dificuldades em adaptar as estruturas físicas existentes para tecnologias mais sustentáveis. Esses desafios exigem abordagens integradas e investimentos contínuos, com foco em estratégias específicas para enfrentar as particularidades regionais e urbanas do país.

A Norma de Referência nº 12/2025, recentemente publicada pela ANA, representa um avanço importante ao estabelecer diretrizes claras sobre a estruturação dos serviços, definindo escopo, titularidade e possibilidades de integração contratual com os serviços de abastecimento e esgoto. A norma também promove o uso de infraestrutura verde, incentiva o planejamento integrado com ordenamento urbano e propõe parâmetros mínimos de operação, manutenção e monitoramento dos sistemas.

De acordo com Luana Pretto, presidente-executiva do Instituto Trata Brasil, é preciso que o serviço de drenagem e manejo de águas pluviais também seja uma prioridade da gestão pública. “O cenário da drenagem e manejo de águas pluviais no Brasil é extremamente precário e isso leva a um risco direto para a vida da população. Com as cada vez mais presentes chuvas intensas, não investir no tema é condenar milhões de brasileiros a uma vida de incertezas. E como vamos evoluir no tema se 94,7% municípios do país não contam sequer com um Plano Diretor de Drenagem e Manejo de Águas Pluviais? Os governantes devem aprender com seus próprios erros e os dos seus antecessores, que historicamente negligenciaram essa questão, e priorizar urgentemente os investimentos em drenagem urbana e manejo de águas pluviais. Portanto, neste primeiro ano dos novos mandatos da Prefeituras de todo Brasil, será preciso encaixar no planejamento municipal e nos respectivos orçamentos a necessidade urgente de soluções de drenagem urbana à população”, finaliza a executiva.

O diagnóstico apresentado no estudo desenvolvido pelo Trata Brasil em parceria com a GO Associados mostra como a falta de planejamento urbano se reflete na atual precariedade da infraestrutura de drenagem e manejo de águas pluviais urbanas. O marco regulatório do saneamento mostra o caminho a ser seguido: distribuição das responsabilidades de planejamento, operação dos serviços e fortalecimento da regulação. É necessário, portanto, o próximo passo: que os municípios criem as condições para a adequada prestação dos serviços e que priorizem também a drenagem urbana como parte do saneamento para assim alavancar investimentos no setor. Quando se compara a média de investimentos dos últimos seis anos (R$ 10,0 bilhões) com os valores necessários a universalização, nota-se que seria preciso praticamente dobrar o atual patamar para que em 2033 os objetivos fossem cumpridos. Somente com o aumento dos investimentos, associado a uma melhoria da gestão, evitaremos as tragédias climáticas nos espaços urbanos”, afirma Gesner Oliveira, sócio da GO Associados.

Fonte: Instituto Trata Brasil
Resumo do estudo: Resumo-Executivo_Estudo-Drenagem_Online.pdf

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